Vestígios da fé cristã no vocabulário ocidental
Vestígios da fé cristã no vocabulário ocidental

Vestígios da fé cristã no vocabulário ocidental

Hoje, é comum ver muitas igrejas sendo influenciadas pelo mundo acolhendo heresias e esquecendo-se do verdadeiro motivo pelo qual o Senhor morreu na cruz. 

Tendo como parte da missão evangelística influenciar o mundo pecaminoso levando a luz da salvação de Cristo, os primeiros cristãos se esforçaram em andar segundo a fé que haviam recebido e deixaram muitos vestígios – não somente arqueológicos, mas em costumes e vocabulários que muitos dos quais sobreviveram nestes quase dois mil anos.   

 

Quero mostrar a influência da fé dos primeiros cristãos no nosso vocabulário, bem como de alguns costumes. Os cristãos primitivos viviam na época do Império Romano, que por sua vez tinha uma grande influência helenística. É interessante notar que muitas línguas ocidentais modernas têm influência grega, latina, e hebraico-cristã. Ao longo da história os cristãos readaptaram muitas palavras dando-as um novo sentido, criando uma nova linguagem, digamos: o “cristãonês”, inicialmente compreendido somente entre os cristãos. Não era nenhum código secreto cristão, mas apenas expressões de crenças (deles e nossos).

 

Como são inúmeras palavras, tomarei como exemplo apenas a palavra cemitério e algumas outras relacionadas. Macabro? A origem da palavra “macabro”  está relacionada com Judas Macabeu, que consta no livros apócrifos inter-testamentário. Judas viveu uma época horrenda quando os gregos invadiram Jerusalém e mataram muitos dos seus compatriotas em 165 a.C.

 

Cemitério de Hierápolis

Cemitério de Hierápolis

O cemitério de Hierápolis foi a maior necrópole cristã da Ásia Menor (atual Turquia) e situa-se numa área de aproximadamente um quilômetro quadrado. Cerca de 1200 tumbas e sarcófagos nos vários estilos com nomes ou homenagens escritos em grego ou latim podem ser avistados no sítio arqueológico de Hierápolis.

 

Na época do Império Romano, Hierápolis abrigava grandes assentamentos judaicos. Os apóstolos estiveram em Hierápolis onde muitos judeus e gentios se converteram ao cristianismo. 

 

Hierápolis não era um grande assentamento, mas tem enormes terras de necrópole porque era uma cidade sagrada e os idosos costumavam se beneficiar dos banhos termais e passar seus últimos dias para depois de morrerem, lá serem sepultados.

 

Além disso, algumas pessoas que moravam nas proximidades também foram sepultadas lá por vontade própria.

 

Um dos primeiros

Clique na imagem para ampliar 1 – Cemitério de Hierápolis

A Necrópole de Hierápolis é um dos primeiros cemitérios da história. Antes, só havia necrópoles, sepulturas, túmulos e jazigos.

 

Você poderá achar isto apenas questão de jogo de palavras, mas na verdade há uma diferença etimológica (origem da palavra) entre necrópole e cemitério – diferença esta que se reflete na cultura, religião, e consequentemente da fé das pessoas de uma sociedade.

 

Necrópole: do grego Nekropolis, significa cidade dos mortos. Eram denominados necrópoles os locais de sepultamento coletivo.

 

Cemitério: também não deixa de ser um lugar de sepultamento coletivo, no entanto, este termo passou a ser utilizado pelos primeiros cristãos justamente para diferenciar das necrópoles comuns.  

 

Por considerarem um destino nobre, gregos e romanos já cremavam os seus mortos desde 1000 a.C e 750 a.C. e reservavam o sepultamento para os criminosos, suicidas e vítimas de raios – este último por considerarem castigo dado por seus deuses mitológicos (talvez daí as expressões de maldição como “raios!” ou “raio que o parta!”). Com o advento do cristianismo na Península da Anatólia, os cristãos mudaram drasticamente os ritos funerários, passando a sepultar os seus mortos sem cremá-los. 

 

Cemitério – o local de sepultamento dos primeiros cristãos

Túmulo do apóstolo Filipe em Hierápolis, segundo o arqueólogo italiano Francesco d’Andria

Para diferenciar da necrópole pagã, os primeiros cristãos escolheram os termos Koimetérion (grego) ou Coemeteriu (latim) para denominar o lugar para os seus mortos. Ambos os termos significam dormitório ou quarto de dormir. Assim, acreditavam que o termo cemitério ou dormitório expressava melhor a esperança da ressurreição:

  • “Depois foi visto, uma vez, por mais de quinhentos irmãos, dos quais vive ainda a maior parte, mas alguns já dormem também.” 
  • “Porque os que dormem, dormem de noite, e os que se embebedam, embebedam-se de noite.” (1 Co 15:6)

  • “Mas de fato Cristo ressuscitou dentre os mortos, e foi feito as primícias dos que dormem.” (1 Ts 5:7)

  • “Dizemo-vos, pois, isto, pela palavra do Senhor: que nós, os que ficarmos vivos para a vinda do Senhor, não precederemos os que dormem.” (1 Co 15:20)

  • “Porque, se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também aos que em Jesus dormem, Deus os tornará a trazer com ele.” (1 Ts 4:15)

  • “Por causa disto há entre vós muitos fracos e doentes, e muitos que dormem.” (1 Ts 4:14)

  • “Não quero, porém, irmãos, que sejais ignorantes acerca dos que já dormem, para que não vos entristeçais, como os demais, que não têm esperança.” (1 Co 11:30)

 

A palavra cemitério ocorre uma única vez em Mateus 27:7 como a seguir:

“E, tendo deliberado, compraram com elas o campo do oleiro, para cemitério de forasteiros.”

 

Um monumental sarcófago no Museu de Istambul
Um monumental sarcófago no Museu de Istambul

Sepulcro; túmulo; tumba; casa dos mortos; memorial; necrópole; cidade dos mortos; jazigo; parque das almas; campo da ressurreição… em cada cultura e/ou religião, um nome diferente. Já os cristãos da igreja primitiva preferiam chamar de cemitério. Os que viveram em Cristo nesta fé preciosa, apenas estão adormecidos até que venha o glorioso dia da ressurreição. Assim, os primeiros cristãos designaram cemitério como lugar de descanso. Por isso, em algumas passagens, é usado o termo dormir em Cristo, ou apenas dormir, referindo-se à morte dos cristãos. 

“Porquanto o Senhor mesmo, dada a sua palavra de ordem, ouvida a voz do arcanjo, e ressoada a trombeta de Deus, descerá dos céus, e os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro; depois, nós, os vivos, os que ficarmos, seremos arrebatados juntamente com eles, entre nuvens, para o encontro do Senhor nos ares, e, assim, estaremos para sempre com o Senhor.” (1 Ts 4:16-17)

 

Conclusão

Talvez, agora fiquem mais claras as mensagens que lemos nos evangelhos e nas epístolas, como quando Paulo escreve:

“Assim, pois, irmãos, permanecei firmes e guardai as tradições que vos foram ensinadas, seja por palavra, seja por epístola.” (2 Ts 2:15)

 

Ainda, foi recomendado a Timóteo saber “manejar bem a palavra da verdade” (2 Tm 2:15), e a Tito: “linguagem sadia e irrepreensível” (Tt 2:8). Assim, os primeiros cristãos procuravam viver “acima de tudo, por modo digno do evangelho de Cristo […] firmes em um só espírito, como uma só alma, lutando juntos pela fé evangélica”. (Fp 1:27)

 

A igreja primitiva vivia, respirava, praticava a fé. Em todos os cantos das suas vidas eram visíveis provas de fé, até no vocabulário – coisas essas que nós também devemos aprender a observar para a glória do nosso Senhor.